Infelizmente, parece que se confirma o que se temia: o tristemente famoso "SIRESP", o sistema de comunicação via rádio destinado à Protecção Civil, forças de segurança, bombeiros e outros actores em cenários de catástrofe, esteve inoperacional na área de influência do fatídico incêndio de Pedrógão Grande, durante 14 horas e meia (!).
Entre as 19 horas de sábado (dia 17) e as 9h30 de domingo (dia 18/06/2017), a rede SIRESP falhou na região de Pedrógão Grande, inviabilizando as comunicações entre a Protecção Civil, a GNR e as corporações de bombeiros. Sabe-se que várias das antenas do SIRESP foram destruídas pelo fogo e que diversas estruturas essenciais para o funcionamento da rede, incluindo cabos de fibra óptica, foram afectadas. A alternativa encontrada foi o recurso a uma antena móvel, instalada numa carrinha proveniente de Lisboa. De referir que, das 4 estações móveis pertencentes à empresa do SIRESP, apenas UMA reunia as condições para ser instalada no terreno.
Sendo o blogue "Mundo da Rádio" um espaço dedicado à rádio e às radiocomunicações, coíbo-me de tecer quaisquer comentários políticos, sobretudo quando importa esperar pelo resultado das investigações que devem ser feitas, no sentido de esclarecer cabalmente em que condições específicas ocorreu a maior tragédia associada a incêndios florestais, de que há memória em Portugal. Não obstante, existem questões técnicas relacionadas com a rede de comunicações de emergência que devem ser discutidas.
Se o SIRESP é (ou devia ser) uma rede de comunicações concebida para estar operacional mesmo em situações de desastre natural, onde as redes convencionais (telefone, redes móveis, Internet, etc) podem falhar, então Portugal deveria ter uma rede SIRESP com diversos níveis de redundância que assegurassem o funcionamento do sistema inclusivamente em situações de corte de energia eléctrica durante largas horas, destruição de cabos de comunicação de dados (fibra óptica, etc), destruição de torres, etc. Esperava-se que a electricidade falhasse, as redes móveis falhassem, a Internet deixasse de funcionar... mas o SIRESP continuasse a funcionar, apesar das contingências. Se o SIRESP falha num incêncio, o que dizer do dia em que houver um sismo violento, um tornado, inundações ou outro evento de gravidade extrema, que possa pericitar a vida de milhares de pessoas? De que servem dezenas de walkie-talkies que, de um momento para o outro, deixam de comunicar uns com os outros, porque a base deixou de operar? Quantos riscos não podem ser evitados em 14 horas? Quantas vidas podem ser salvas se, durante 14 horas e meia, a rede de emergência continuar a funcionar adequadamente, não perdendo o sinall? Apesar do SIRESP permitir a comunicação directa entre transceptores, esta limita-se aos equipamentos geograficamente próximos, inviabilizando uma operação em larga escala, como é exigível num combate a um incêndio violento.
Havendo muito para investigar, não tiro, para já, qualquer ilação a respeito das causas específicas das causas das falhas de comunicação, mas, se me é permitido a ironia, quiçá fosse mais vantajoso oferecer às corporações de bombeiros walkie-talkies PMR446. Ao menos funcionam sem falhas mesmo quando as antenas do SIRESP deixam de conseguir "falar" entre si. Felizmente que ainda há veículos dos bombeiros com rádios analógicos... Por este andar, um dia assistimos a bombeiros a comunicar com a GNR através de... sinais de fumo.
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